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O PIX, a China e os direitos humanos

发布时间:2025-08-12

O PIX, a China e os direitos humanos

Source: Opera Mundi Published: 2025-7-28

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Um grupo de intelectuais da China e da América Latina reuniu-se num encontro para debater direitos humanos numa perspectiva do Sul Global. A Segunda Mesa Redonda China-América Latina e Caribe sobre Direitos Humanos – a primeira aconteceu no ano passado, no Rio de Janeiro –, com a presença de pesquisadores de 20 diferentes países, da Argentina ao México, ocorreu em São Paulo, na sexta-feira (25).

Houve muitos debates interessantes – num deles, coordenado pelo professor Evandro Menezes de Carvalho, da Universidade Federal Fluminense (UFF), discutiu-se sobretudo a proteção dos direitos humanos na era digital e da inteligência artificial. O assunto é urgente, tanto na China, que ganhou destaque na área ao tornar públicos vários projetos de IA generativa recentemente, quanto na América Latina, cuja produção de dados está sob vigilância incontrolável de governos e grandes players tecnológicos, sobretudo ocidentais, numa espécie de colonialismo digital.

Vários dos acadêmicos presentes discutiram questões legais, entre outras razões porque o governo chinês tem tratado como uma de suas metas o fortalecimento do Estado de Direito e a defesa de questões como o direito à privacidade e os direitos autorais. Mas, entre pesquisas e preocupações de longo prazo, um tema urgente apareceu na discussão: o ataque dos Estados Unidos ao PIX brasileiro.

O economista Andres David Arauz Galarza, ex-candidato à Presidência do Equador e pesquisador da Clacso (Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais), discutiu justamente o direito à privacidade diante da vigilância financeira hegemônica – e como dados de pessoas físicas podem ser usados, sobretudo pelos Estados Unidos, para definir políticas globais e também específicas.

E aí entra uma das explicações para o ataque de Donald Trump ao PIX brasileiro. Desde o Ato Patriótico, instituído após os ataques contra as Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001, os Estados Unidos têm acesso a informações sobre todas as transações financeiras feitas através de bandeiras como Visa e MasterCard – ou seja, há mais de duas décadas, a cada compra que fazemos na farmácia da esquina ou num site australiano, informamos também o Estado norte-americano sobre o que fazemos e pensamos.

Por qualquer entrada, seja um número de identificação de um documento, como passaporte, RG, CPF, ou o próprio número do cartão de crédito, é possível levantar não só a movimentação financeira, como também rastrear trajetos físicos de quem usa essas bandeiras para além dos próprios gastos.

Porém, mais do que isso, num mundo em que a capacidade de análise de dados se torna gigantesca, por conta dos mecanismos de processamento e inteligência artificial, as possibilidades de planejamento para as guerras comerciais se multiplicam, com a utilização de dados em massa.

É aí que entra o PIX. Por usar uma tecnologia própria, o PIX brasileiro deixou de fornecer, pelo menos tão facilmente, dados estratégicos para os Estados Unidos. Além disso, mostrou a possibilidade de que outros países do mundo possam fazer o mesmo.

O PIX ameaça os Estados Unidos justamente porque fere de morte a ideia de que o Sul Global não é capaz de desenvolver tecnologias de ponta, universais e gratuitas, mas também porque tira efetivamente do controle da nação hegemônica essas informações. Num mundo em que a invasão da privacidade individual em massa se combina com todas as outras lógicas de dominação, temos um buraco no casco do Titanic que pretende governar o mundo.

Consenso de São Paulo

Ao final do encontro, os representantes dos 20 países divulgaram uma carta intitulada “Consenso de São Paulo”. A carta reafirmou o interesse em ampliar a cooperação multilateral em direitos humanos e declarou que, diante de um cenário mundial instável, é preciso adotar uma abordagem compartilhada e respeitosa da diversidade cultural e histórica das nações envolvidas.

O documento defende que a proteção dos direitos humanos deve respeitar as realidades nacionais, promovendo conjuntamente direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. Destacou-se ainda a importância da manutenção da paz, da estabilidade e do desenvolvimento para que se possa garantir esses direitos. Os participantes enfatizaram que não há um único modelo válido universalmente na questão, e que a diversidade deve ser valorizada na busca por justiça social.

O texto do grupo alerta para a necessidade de garantir acesso equitativo aos avanços tecnológicos e de criar normas éticas para seu uso. A capacitação digital ampla e a prevenção de desigualdades tecnológicas foram apontadas como medidas urgentes para proteger os direitos fundamentais em tempos de inovação acelerada.

Outro ponto reforçado foi a importância do multilateralismo e da solidariedade Sul-Sul no enfrentamento dos desafios ambientais e sociais. Também a proteção ambiental foi destacada como direito humano essencial, exigindo desenvolvimento sustentável e governança ecológica. Por fim, o Consenso de São Paulo propôs o fortalecimento de redes acadêmicas e de mecanismos permanentes de cooperação, bem como o reforço das Organizações das Nações Unidas como eixo da governança global dos direitos humanos.

Leia abaixo a íntegra do Consenso de São Paulo

Nós, representantes da China e dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos, reunimo-nos em 25 de julho de 2025 em São Paulo, Brasil, por ocasião da Segunda Mesa Redonda China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos sobre Direitos Humanos, e comunicamos profundamente sobre o tema “Comunidade com Futuro Compartilhado entre a China e a América Latina e o Desenvolvimento dos Direitos Humanos”, alcançando amplo consenso. Aqui, propomos o lançamento da “Rede de Cooperação e Pesquisa sobre Direitos Humanos China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos”, utilizando o intercâmbio acadêmico como elo para estabelecer uma plataforma de cooperação regular no campo da pesquisa em direitos humanos. Por meio do compartilhamento de informações, pesquisas conjuntas, capacitação de talentos e intercâmbio de experiências, promoveremos o desenvolvimento conjunto dos Direitos Humanos China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos, e ofereceremos novas contribuições e caminhos para o aprimoramento da governança global dos direitos humanos.

As medidas específicas incluem:

1. Estabelecer um mecanismo de compartilhamento de informações. Realizar comunicações regulares sobre políticas, resultados acadêmicos e dados de pesquisa dos direitos humanos China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos, comunicando-se por e-mail e plataformas de mídia social.

2. Inovar e impulsionar pesquisas conjuntas. Incentivar intercâmbios acadêmicos diversificados e seminários sobre políticas em torno de áreas-chave e temas prioritários dos Direitos Humanos China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos, divulgando relatórios de pesquisa conjunta e publicações.

3. Fortalecer a capacitação em políticas dos direitos humanos Promover educação e treinamento em direitos humanos, reforçar a construção de disciplinas e a formação de talentos, e convidar especialistas latino-americanos e caribenhos para participarem nos projetos de pesquisa de curto prazo e programas de treinamento na China, fomentando o intercâmbio bilateral.

4. Criar um banco de dados de casos Compilar resultados de pesquisa e casos práticos dos Direitos Humanos China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos, promovendo seu compartilhamento, aplicação e transformação em escala global, fornecendo referências para a governança internacional dos direitos humanos.

Convidamos instituições e representantes de mais países e regiões a se juntarem à “Rede de Cooperação e Pesquisa sobre Direitos Humanos China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos”, para juntos escrevermos um novo e grandioso capítulo na construção da Comunidade de Futuro Compartilhado China-Estados Latino-Americanos e Caribenhos e o Desenvolvimento da Causa dos Direitos Humanos!